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Concessionária acumula 74 multas e pode pagar R$ 2 bilhões por abandono de ferrovia; trilhos em MS revelam cenário de degradação extrema

Foto: reprodução/O Pantaneiro
Rogério Potinatti
20/10/2025
às
8:00

A concessionária Rumo Malha Oeste enfrenta uma série de 74 autuações registradas entre 2021 e 2024 por abandono e más condições de manutenção nos 1.973 quilômetros de ferrovia que ligam Mairinque (SP) a Corumbá (MS) — um traçado que corta o coração econômico da região Leste de Mato Grosso do Sul, passando por Três Lagoas, onde o cenário é de trilhos corroídos, dormentes apodrecidos e trechos completamente inoperantes.

Mesmo com o contrato de concessão previsto para encerrar em junho de 2026, a empresa já é alvo de um processo que pode resultar em indenização de até R$ 2 bilhões ao governo federal. A cifra leva em conta os critérios definidos pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), que apura o nível de deterioração da via e o descumprimento das obrigações contratuais.

A situação da Malha Oeste é comparada à de outros trechos devolvidos ao governo, como a Ferrovia Transnordestina, que teve operação interrompida por falta de manutenção. Segundo relatórios técnicos, a Rumo deixou de investir o necessário para manter o traçado em condições mínimas de segurança — o que inclui a via permanente que passa por Três Lagoas, principal porta de entrada da ferrovia em Mato Grosso do Sul e um dos trechos mais afetados pelo abandono.

O relatório da ANTT menciona que há falhas graves no cumprimento das normas da ABNT, restrições de velocidade em mais de 470 pontos e ausência de vigilância patrimonial, com invasões na faixa de domínio e furto de trilhos. As imagens anexadas ao processo mostram dormentes podres, vegetação densa sobre os trilhos e estruturas metálicas enferrujadas — um retrato de negligência que compromete não apenas o transporte de cargas, mas também o potencial logístico da região.

A própria ANTT destaca que “a depreciação não é hipotética: é concreta, visível e perigosa”, e que tratar esse cenário como mero desgaste natural seria ignorar “a crua realidade dos fatos, fartamente documentada e tecnicamente comprovada pela equipe de fiscalização”.

reprodução/O Pantaneiro

Rumo argumenta

Apesar das autuações e dos relatórios, a Rumo tenta reverter o quadro. A empresa argumenta que parte da depreciação é natural e que investimentos feitos ao longo dos anos deveriam ser compensados como crédito na conta final da concessão.

A companhia afirma ainda que segue comprometida com os “investimentos essenciais à continuidade do serviço de transporte ferroviário até a assunção pela nova concessionária”.

Enquanto isso, especialistas alertam que o abandono da Malha Oeste prejudica diretamente a competitividade da região Leste do Estado, responsável por grande parte da produção industrial e florestal de Mato Grosso do Sul, além de ser um ponto estratégico para o escoamento de cargas rumo aos portos do Sudeste.

A Instrução Normativa nº 1/2025, publicada em janeiro pela ANTT, deve servir como base para o cálculo final da indenização — agora com critérios mais rigorosos e foco em evitar que o abandono de trechos ferroviários gere compensações indevidas às concessionárias.

O caso da Rumo Malha Oeste simboliza um impasse que vai além da ferrovia: representa o desafio de garantir infraestrutura adequada a um Estado que se consolida como polo de exportação, celulose e bioeconomia, mas ainda depende de uma malha ferroviária deteriorada para conectar sua força produtiva ao restante do país.

reprodução/O Pantaneiro