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Patentes Farmacêuticas: o impacto da adoção do sigilo dos testes farmacêuticos na indústria de medicamentos genéricos no Brasil ‍

Foto:
Ester Pereira Barbosa Alves
21/5/2025
às
20:00

À medida que o Brasil celebra mais de 26 anos da Lei de Medicamentos Genéricos (Lei nº 9.787, de 10 de fevereiro de 1999), um debate significativo tem tomado forma na Comissão de Ciência e Tecnologia do Senado, implementação do sigilo aos testes clínicos em medicamentos humanos, conhecida como proteção regulatória do dossiê de testes (PRDT).

A proteção regulatória (PRDT) visa garantir o sigilo do relatório de testes por um período de cinco anos, impedindo que essas informações sejam utilizadas na análise comparativa de testes para o processo de autorização de produtos genéricos. Atualmente, quando um fabricante submete os dados de testes clínicos à Anvisa para o registro de um novo medicamento, essas mesmas informações se tornam fundamentais para a economia do procedimento de análise comparativa que ocorre na autorização de produtos genéricos. 

A Anvisa utiliza os dados do dossiê do medicamento de referência como parâmetro para comparar os resultados dos testes de bioequivalência e biodisponibilidade realizados pelo fabricante do genérico. Com acesso a essas informações, a agência consegue verificar se o genérico se comporta de forma idêntica ou muito similar ao medicamento original no corpo humano, eliminando a necessidade de reavaliar a segurança e eficácia do princípio ativo do zero e, assim, facilitando a autorização de produtos genéricos.

No entanto, a adoção sigilo do dossiê alteraria essa dinâmica. As informações que hoje estão disponíveis para a análise dos genéricos ficariam confidenciais por um período de cinco anos, impedindo sua inclusão no processo de autorização de produtos genéricos durante esse tempo.

A adoção do sigilo do dossiê, em conjunto com o período de proteção patentária, assegura à indústria farmacêutica um retorno financeiro consideravelmente maior sobre os investimentos em pesquisa e desenvolvimento da tecnologia do medicamento.

Além disso, a indústria produtora do medicamento de referência teria garantido uma espécie de monopólio estendido no mercado. Isso ocorreria porque, embora as produtoras de genéricos possam fabricar o medicamento após os 20 anos da expiração da patente, o sigilo do dossiê impediria que elas utilizassem as informações clínicas durante o período de cinco anos. Isso somaria, portanto, 25 anos de exclusividade para o medicamento patenteado.

Nessa discussão também se deve levar em conta outros impactos advindos dessa proteção. No campo da pesquisa, as indústrias farmacêuticas de genéricos, em sua maioria brasileiras, seriam forçadas a aumentar significativamente o investimento em pesquisa tecnológica, desenvolvimento e testes clínicos comparativos. Isso, por sua vez, elevaria consideravelmente os custos dos medicamentos genéricos no mercado.

Com o aumento do tempo destinado na pesquisa, os medicamentos genéricos poderiam levar anos adicionais para chegar ao mercado, o que impactaria diretamente o acesso da população a esses remédios nas farmácias e no SUS. Além disso, haveria possibilidade do aumento na judicialização para o acesso a medicamentos de referência de alto custo e uma diminuição na participação das farmacêuticas nacionais no mercado.

Atualmente, não há nenhum projeto de lei em tramitação que busque estender a proteção regulatória do dossiê de testes (PRDT) para medicamentos farmacêuticos. Embora essa proteção já seja concedida a medicamentos veterinários e agrotóxicos pela Lei 10.603 de 2002, os debates em audiências públicas têm levantado preocupações significativas sobre o acesso da população a medicamentos genéricos caso essa medida fosse implementada.

Atualmente a proteção da PRDT já foi reconhecida por mercados desenvolvidos e em desenvolvimento. Chile, México e Colômbia promulgaram o sigilo do dossiê por um período fixo de cinco anos de exclusividade. Na União Europeia é de 10 anos e nos Estados Unidos é de 5 a 12 anos. Por essa razão é fundamental a discussão da matéria e análise dos seus efeitos sociais e econômicos. 

*Com informações da Agência Senado

Por:

Ester Pereira Barbosa Alves

Advogada de Propriedade Intelectual